O patrono mitológico do teatro indiano antigo era Shiva, o Dançarino Cósmico que, dançando, "gera tudo o que é e tudo o que é destruirá"; aquele que "dança a totalidade". (...) Shiva, nos contos mitológicos, aparece como criador dos opostos. Nas esculturas antigas era representado com os olhos entreabertos, levemente sorridente; o seu rosto trazia a marca de quem conhece a relatividade das coisas. (...) Se eu tivesse que definir as nossas pesquisas cenicas com uma frase, referiria-me ao mito da Dança de Shiva, diria "brincamos de Shiva". Há nisso uma tentativa de absorver a realidade de todos os seus lados, na multiplicidade dos seus aspectos, e ao mesmo tempo um permanecer como de fora, longe, a distância extrema. Em outras palavras, a dança da forma, o pulsar da forma, a fluida, refrangente multiplicidade das convenções teatrais, dos estilos, das tradições da actuação; a construção dos opostos: do jogo intelectual na espontaneidade, da seriedade no grotesco, da derrisão na dor; a dança da forma que quebra qualquer teatro de ilusão, qualquer "verossimilhança com a vida", mas, ao mesmo tempo, nutre a ambição (evidentemente insatisfeita) de conter em si, de absorver, de abraçar a totalidade, a totalidade do destino humano e, através disso, a totalidade da "realidade geral"; e ao mesmo tempo manter os olhos entreabertos, um leve sorriso, a distância, o conhecimento da relatividade das coisas. (...) O Teatro indiano antigo, como o japonês antigo e o helenico, era um ritual que identificava em si a dança, a pantomina, a actuação. O espectáculo não era "representação" da realidade (construção da ilusão), mas "dançar" a realidade (uma construção artificial, algo como uma "visão rítmica" voltada à realidade). A dança mímica na liturgia dos Pashupati (uma seita shivaística) que era um dos seis principais actos rituais. (...) a citação mitológica: "Shiva diz: Sem nome sou, sem forma e sem acção (...). Eu sou pulsar, movimento e ritmo..." (Shiva Gita). A essência do teatro que procuramos é "pulsar, movimento e ritmo".
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O patrono mitológico do teatro indiano antigo era Shiva, o Dançarino Cósmico que, dançando, "gera tudo o que é e tudo o que é destruirá"; aquele que "dança a totalidade". (...)
Shiva, nos contos mitológicos, aparece como criador dos opostos. Nas esculturas antigas era representado com os olhos entreabertos, levemente sorridente; o seu rosto trazia a marca de quem conhece a relatividade das coisas. (...)
Se eu tivesse que definir as nossas pesquisas cenicas com uma frase, referiria-me ao mito da Dança de Shiva, diria "brincamos de Shiva".
Há nisso uma tentativa de absorver a realidade de todos os seus lados, na multiplicidade dos seus aspectos, e ao mesmo tempo um permanecer como de fora, longe, a distância extrema. Em outras palavras, a dança da forma, o pulsar da forma, a fluida, refrangente multiplicidade das convenções teatrais, dos estilos, das tradições da actuação; a construção dos opostos: do jogo intelectual na espontaneidade, da seriedade no grotesco, da derrisão na dor; a dança da forma que quebra qualquer teatro de ilusão, qualquer "verossimilhança com a vida", mas, ao mesmo tempo, nutre a ambição (evidentemente insatisfeita) de conter em si, de absorver, de abraçar a totalidade, a totalidade do destino humano e, através disso, a totalidade da "realidade geral"; e ao mesmo tempo manter os olhos entreabertos, um leve sorriso, a distância, o conhecimento da relatividade das coisas. (...)
O Teatro indiano antigo, como o japonês antigo e o helenico, era um ritual que identificava em si a dança, a pantomina, a actuação. O espectáculo não era "representação" da realidade (construção da ilusão), mas "dançar" a realidade (uma construção artificial, algo como uma "visão rítmica" voltada à realidade).
A dança mímica na liturgia dos Pashupati (uma seita shivaística) que era um dos seis principais actos rituais. (...) a citação mitológica: "Shiva diz: Sem nome sou, sem forma e sem acção (...). Eu sou pulsar, movimento e ritmo..." (Shiva Gita).
A essência do teatro que procuramos é "pulsar, movimento e ritmo".
Jerzy Grotowski
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