sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Daí

Jorrar e jorrar, irromper, brotar de si algo tal como eu, em círculos de círculos de círculos. Ribombar e cair, advir daí, daí, daí, daí, daí, daí, DAÍ. Que alguém me ouça, um que seja. Daí que venha.

Quem

Ir além do muito que se há de ter no dia em que alguém venha e traga consigo algo esquecido. Um tanto ou quanto de nada para ser talvez menos que ter o nascer. E morrer sem saber que se foi mais do que ser, tanto e tão pouco.

Passar

O sono evapora-se como nuvens de lama e aço por entre torrentes de mel incandescente. No chão o bosque, o lago despido na névoa do primeiro outono, os véus subtilmente se agitando pelo rumor da noite que cai sob a terra. Finos fios de sombra perduram nos espaços de outrora, rastos de sonho e olvido dos tempos que vêm.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Imago Dei

A única religião verdadeira é aquela para a qual tudo o que ela não é é heresia. Parece ser redundante dizer heresia dela própria, no entanto aquilo que é o próprio da religião é um outro, o radicalmente outro; a heresia é o outro da religião, a falta. A única religião verdadeira é a religião que coincida com a sua heresia, porque toda a heresia é a sua falta e o que falta à religião é Deus.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Alvor

Chega hoje a boa nova à orla da núbia terra. Jorram anjos do altar do tempo, ingénitas energias triunfantes na madrugada do esplendor. É o alvor teofânico do além cantado nos milénios por vir, incriado exalar da comunidade dos santos.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Nós somos aqueles por quem temos esperado

You have been telling the people that this is the Eleventh Hour. Now you must go back and tell the people that this is The Hour. And there are things to be considered:

Where are you living?
What are you doing?
What are your relationships?
Are you in right relation?
Where is your water?
Know your garden.
It is time to speak your Truth.
Create your community. Be good to each other. And do not look outside yourself for the leader.

This could be a good time!

There is a river flowing now very fast. It is so great and swift that there are those who will be afraid. They will try to hold on to the shore. They will feel they are being torn apart, and they will suffer greatly.

Know the river has its destination. The elders say we must let go of the shore, push off into the middle of the river, keep our eyes open, and our heads above the water. See who is in there with you and celebrate.

At this time in history, we are to take nothing personally. Least of all, ourselves. For the moment that we do, our spiritual growth and journey comes to a halt.

The time of the lone wolf is over. Gather yourselves!

Banish the word struggle from your attitude and your vocabulary.

All that we do now must be done in a sacred manner and in celebration.

We are the ones we've been waiting for.

—The Elders Oraibi
Arizona Hopi Nation

sábado, 12 de julho de 2008

Demorar

Ainda que me sinta na necessidade de romper estritamente com qualquer tipo de distanciação que me pareça albergar em si uma espécie de convencionalidade consentida - ao fim e ao cabo uma ideologia, no sentido muito preciso que ela ganha na contemporaneidade a partir de Althusser, hoje bastante acentuado por Slavoj Žižek: i.e., o de ser inconsciente -, sinto-me igualmente, como se depreende daquilo que estou neste mesmo momento a escrever, obrigado a mantê-la. Obviamente que se encontra aqui em causa a reciprocidade que se estabelece entre a minha representação do blog como uma totalidade coerente, à qual - depois de um impulso criativo primeiro que inevitavelmente ganhou forma e projecto assim que o decidi substanciar num blog -, me submeti, aparentemente, de um modo voluntário, e a representação de todo o outro que leia aquilo que eu escrevo. "Aquilo que eu escrevo", justamente porque só neste movimento de reciprocidade entre a representação que eu faço do blog e aquilo que eu julgo ser a expectativa criada pela representação do outro, como é ridículo!, na verdade a representação da representação que o outro faz da minha representação; só neste movimento é que me posso constituir como autor, ou representar-me como tal.

Tudo isto apenas me conduz à minha "intenção" original de escrita, que era a de falar de algo do qual entretanto me esqueci durante a própria escrita, para depois me lembrar e automaticamente colocar em questão devido ao rumo que essa escrita tinha tomado. No entanto agora ganha uma dimensão enorme e profunda, simplesmente porque sinto despontar nela um sentido que me estava oculto nesse momento supostamente original da intenção primeira e que somente despontou da minha hesitação - palavra cara a Bergson - na escrita.

Demorar, ainda não pensei bem esta palavra. Demoro-me na escrita, estou, permaneço, nela e ao mesmo tempo, justamente, ela demora-se em mim, aparecendo-me como atraso. E não pára de bradar em mim o pensamento de que isto é uma espécie de alegoria literária da experiência de Deus.

terça-feira, 1 de julho de 2008

Algo em mim de podre se desfaz.

Sou como caruma perdida algures na terra húmida do Inverno, aguardando uma - talvez - ilusória redenção no saturnino lodaçal.

Um pouco de nada me sabe escutando-o, pequeno, minúsculo, ínfimo.

É SANGUE ESCORRENDO DA IMENSA FERIDA DARDEJANTE DAS ALMAS, CLAMOR INFINITO DOS MORTAIS ESPÍRITOS; ÉTER DERRAMADO NA SUPERFÍCIE DOS ABISMOS.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Produção

Produzo-me e consumo-me vezes sem conta, ininterruptamente, a uma velocidade tal que me chego a sentir imóvel. Sou aquele que se consuma produzindo-se e que se produz consumando-se; o que resta permanece absoluto, nada.

sábado, 3 de maio de 2008

Agora?

O ser - presença - é a forma do devir, o tempo o conteúdo da eternidade.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Ritmo

O ritmo é a memória da carne.

História

A consciência empírica constitutivamente imersa no seu mundo é espacio-temporal; o aqui e agora, este ponto de origem, é já simultaneamente o processo e o seu resultado, não há nada fora de si. O único caminho para a veri-ficação é a construção, a própria acção de recordar o passado é a projecção do presente como seu futuro, devindo aberto às suas possibilidades na impossibilidade de totalizar o passado tornando-o efectivamente presente.

A História é esta memória do mundo, sem exterior, uma construção com raízes no esquecimento e ignorância que a constituem, além de uma consciência atómica reificada. Um aqui e agora que é exteriorizado assim que é recordado ou interiorizado - e assim historicizado - é já a sua origem e o seu sentido.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Conheço

Como é possível o ecoar dos meus passos no silêncio da noite? O que é isto de não ser eu senão no de me ouvir? Fracturado interiormente na distância de caminhar sempre outro não conheço dar que não seja ser-me dado. Conhecer-me a mim mesmo é morrer.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Morte

Talvez a única verdadeira morte seja a morte de Deus.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Afundo

Da antemanhã da espera irrompe o silêncio do futuro, discurso de quem ouvindo se ainda escuta jorrar; aquém de um outro me afundo na corrente que dele nasce, não mais eu senão o de ele se ser fluindo.

No amanhecer de mim me oculto e de novo aí mergulho eterno.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Te interpelo

O que é o tempo, o que é a eternidade? O que é a carne, o que é o espírito? Terei eu medo de viver o próximo momento? Terei eu medo de ser o futuro?

Só um abismo tem o tamanho da nossa liberdade; lancemo-nos nele, porque é que havemos de cair?

sábado, 2 de fevereiro de 2008

Vamos

Dá-me a tua mão, mergulha comigo aí onde cantamos dizendo: afinal o infinito coube em nós. Ajuda-me a recordá-lo, tu que me olhas, ajuda-me a ser quem somos nessa memória; então riremos e daremos graças ao porvir, abertos, fluindo no sentido da origem.

Arrisca um gesto comigo. Vem! Eu aqui não fico, não posso ficar.